domingo, dezembro 10, 2006

Dunas perderam dez metros de areia

Dunas perderam dez metros de areia Costa de Caparica: INAG vai colocar areia nas praias para evitar avanço mar 09.12.2006 - 22h10 Lusa

O Instituto Nacional da Água vai colocar areia nas praias do Norte da Costa de Caparica a partir de amanhã para evitar o avanço do mar e proteger as habitações e estabelecimentos comerciais, informou o Ministério do Ambiente.
A governadora civil de Setúbal, Teresa Almeida, alertou anteontem para o "perigo eminente" do avanço do mar nas praias de São João provocar a ruptura das dunas e atingir habitações e estabelecimentos comerciais da zona. Desde então, as dunas têm resistido à preia-mar, mas já perderam mais de dez metros de areia.


O assessor do Ministério do Ambiente, Joaquim Cale, avançou, entretanto, que o INAG está em alerta permanente e que a reposição de areia no cordão dunar das praias de São João será efectuado "assim que as condições climatéricas o permitam".O assessor rejeitou a possibilidade de se colocarem pedras para proteger as zonas em perigo, hipótese sugerida pelo presidente da junta de freguesia e pelo dono de um bar que está em perigo de derrocada, visto que o INAG considerou que essa solução iria "agravar ainda mais a situação".


Neste caso, a questão que levanto é se a colocação de areia é realmente uma boa opção a médio-longo prazo. Parece-me óbvio que as causas da erosão se irão manter e no próximo ano a situação repetir-se-á. Será sustentável este tipo de medida? Onde se irá buscar a areia e qual a que preço ficará?
A respeito da erosão nas costas o Prof. Mota Oliveira refere que "a principal causa de degradação da costa está nas barragens, que impedem a alimentação das praias com sedimentos dos rios. Os rios, quando não tinham barragens, transportavam até ao mar a areia resultante da erosão nas bacias hidrográficas. Mas as barragens, para além de reterem a água, também retêm sedimentos. E estes, que antigamente alimentavam as praias, agora ficam nas albufeiras - com a agravante de, em alguns locais, os sedimentos que existem nos leitos dos rios serem extraídos para a construção civil. Ora, se nas praias as ondas têm menos areia para transportar, removem a que lá está."
Este é um problema grave e de resolução dificil, tendo em conta que a origem do problema apresenta uma complexidade elevada. Contornar o efeito das barragens no fenómeno do transporte de sedimentos representa custos elevados. Na praia em questão o INAG optou por se encarregar pela colocação de areia na praia, substituindo assim uma das funções dos rios no equilíbrio dos ecossistemas, entretanto fragilizadas pelo próprio Homem.
Uma das outras formas de contrariar o efeito desta erosão diz respeito à construção de esporões, que levam à acumulação de sedimentos de um dos lados (que está voltado para a corrente), no entanto, provoca um aumento da erosão do lado oposto. Este aumento da erosão do lado oposto pode ser contrabalançado com um novo esporão, que, por sua vez, coloca os mesmo problemas que o esporão anterior. Esta situação leva a que, por exemplo no sul de Espanha, seja muito comum a construção de vários esporões com espaçamento constante, terminando numa zona em que a erosão não provoca danos significativos.
Sul de Espanha (image do Google Earth)
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A costa do sul de Espanha sofre bastante com a erosão, essencialmente devido às características do mar mediterrâneo, cujas correntes apresentam maior força no sentido do mar do que no sentido da praia, arrastando as areias para os fundos oceânicos.
Em Portugal o mar apresenta condições menos desfavoráveis, sendo mais variáveis as suas acções sobre a costa, no entanto vão crescendo as situações de erosão, essencialmente devidas à existência das barragens.
É importante abordar o assunto de forma integrada e com a imparcialidade que a situação exige.
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António Aguiar da Costa


12 comentários:

Anónimo disse...

Segundo notícias veiculadas na imprensa de hoje as "Areia para praias da Caparica custam 15 milhões de euros". Concordo com o Aguiar da Costa pois não é sustentável andar a desbloquear verbas consideráveis para "remendar" uma situação que necessita realmente de um plano estratégico e eficaz de preservação e manutenção das, se é que lhes podemos chamar, dunas da Costa da Caparica.

Acrescento que a origem dos "3 milhões de metros cúbicos de areia" não vem esclarecida na imprensa.

Anónimo disse...

Relativamente à problemática das barragens gostaria de referir que se trata, evidentemente, de uma questão de opção. Essa opção situa-se entre as mais valias que uma barragem pode trazer, nomeadamente no acréscimo de água disponível para satisfação das mais diversas actividades, entre as quais a produção de alimentos, através da agricultura de regadio, a produção de energia "limpa", através das hidroeléctricas, etc. e as desvantagens do ponto de vista ambiental, que acabam por se verificar bastante significativas.
Quanto à medida adoptada pelo INAG, trata-se de uma solução de recurso, como penso que todos percebem, e que obviamente tem custos elevados, devendo-se essencialmente ao facto de ainda não se promover de forma suficiente uma cultura de planeamento e gestão preventiva, neste como nos mais diversos sectores da engenharia e não só.
Todavia, não nos podemos esquecer que o facto de ser necessário adoptar este tipo de medidas em situação de emergência para proteger vidas e bens, advém de um erro antigo, que infelizmente se verifica ainda nos dias de hoje em vários pontos do país.
No fundo, eu, como a grande maioria do povo português, prezo bastante a costa litoral e alimento o sonho de um dia viver o mais próximo possível da mesma. Pois bem, acontece que esse desejo multiplicado por milhões (de pessoas e de contos), leva a que as construções se façam cada vez mais próximos da linha de costa actual, com novos empreendimentos a serem permitidos em zonas onde a erosão costeira é já uma realidade. É um facto consumado que o problema do recuo litoral pura e simplesmente não existiria (pelo menos com tamanha importância), se não houvesse qualquer tipo de construções nessas zonas!
É este o real problema que enfrentamos nos dias de hoje, e que temos de ter consciência. Não podemos ter tudo! E se queremos que as barragens nos proporcionem a agricultura que nos fornece alguns dos alimentos que temos em casa e alguma da energia que consumimos, sem necessitar de recorrer à produção nuclear, não nos podemos surpreender se um dia, na nossa casa que compramos naquele empreendimento construído bem em cima da praia, o mar nos prega uma surpresa!

Anónimo disse...

Caro Eduardo, não vejo onde possa existir a relação que efectuou entre a erosão costeira e as barragens. As marés não são maioritariamente reguladas pelo caudal dos rios, e o que se passou na Caparica não foi certamente devido a excesso de caudal no rio Tejo.

Anónimo disse...

Caro hbaptista, a relação entre as barragens e a erosão costeira foi primeiramente estabelecida pela citação do Prof. Mota Oliveira, no presente post. Não obstante, partilho da mesma opinião, e convém salientar que as ilações por mim efectuadas em comentário anterior, se baseiam no facto de as barragens não servirem apenas para a regulação de cheias, e a sua construção depender dos mais diversos factores.
Todavia, é precisamente a regulação de cheias e caudais mais elevados dos rios que afectam a erosão costeira. É que com a cosntrução das barragens trava-se o transporte de sedimentos que chegavam ao mar em volumes especialmente consideráveis nas épocas de maiores caudais. Quebrando-se esse transporte, colmata-se a principal fonte de alimentação de areia das praias. Como é óbvio, a influência dos rios sobre o mar não é maioritariamente predominante, mas é precisamente quando os caudais fluviais são mais elevados que essa influência se faz sentir de forma mais acentuada, proporcionando elevados volumes de sedimentos que iriam ser arrastados pelas correntes marítimas e espalhados pelas praias pela ondulação.

Espero que tenha conseguido contribuir para explicitar um pouco melhor a relação entre a questão das barragens e a erosão costeira.

Anónimo disse...

Caro Eduardo, obrigado pela explicação. Foi elucidativo e dissipou as minhas dúvidas.

Anónimo disse...

Eduardo, existe apenas a questão de, como sabemos, as barragens não são compatimentos estanques. Existem as comportas, as eclusas para barcos, as esclusas para peixes, o canal de turbinação, o canal de "bypass", o canal de descarga de fundo, etc... Será que a existencia de todos estes canais prejudica assim tanto o fluxo de sedimentos?

Anónimo disse...

Caro hbatista, como é óbvio esses dispositivos acabam por funcionar como "torneiras" para o fluxo de sedimentos, evitando a interrupção completa deste fluxo.
Todavia, os mais significativos, uma vez que os sedimentos são essencialmente arrastados pelas correntes de fundo, são mesmo os mecanismos de descarga existentes nos níveis mais baixos das albufeiras. Não obstante, mesmo que estas descargas sejam efectuadas com alguma regularidade, nunca será a mesma coisa que os volumes escoados sem qualquer tipo de obstáculo. Além disso estas descargas são normalmente efectuadas somente por questões de limpeza, e precisamente para evitar a colmatação das entradas de água para os canais de turbinação.
Nas grandes cheias, que tenderiam a mobilizar os maiores volumes de sedimentos, grande parte dos volumes afluentes às albufeiras são descarregados pelos dispositivos de superfície pela maior capacidade de vazão de que dispõe, funcionando como os ralos de segurança das banheiras ou lavatórios, por exemplo.

Anónimo disse...

Acredito que os sedimentos de fundo não possam, directamente, causar a colmatação das entradas dos canais de turbinação, uma vez que estes canais localizam-se à mais elevada cota possível, hidraulicamente falando. Neste nosso debate já ficou provado que, de facto, a represa pode ter influência no normal fluxo de sedimentos fluviais. No entanto, é minha opinião, e é aí que julgo existir discórdia consigo, que, as barragens fluviais não são a maior causa da erosão marítima costeira. Existem factores de longe muito mais decisivos como por exemplo a alteração da orla marítima (realizada na Caparica através de inúmeros paredões), eliminação das dunas (na Caparica substituídas por parques de campismo) ou o não respeito por um perímetro seguro de construção (na Caparica existem casas e estradas a metros do mar).

Anónimo disse...

Pelo que percebo, e talvez não o tenha deixado suficientemente claro no meu primeiro post sobre este assunto, estamos efectivamente a falar do mesmo, sendo o único ponto em que é possível que haja alguma discórdia, relacionado com o facto de eu considerar que a barragem e a construção em cima da orla costeira são os principais factores relativos que estão em causa, em igualdade de circunstâncias, nas situações mais preocupantes de erosão costeira, enquanto o hbaptista defende que este último factor é bastante mais importante. Trata-se simplesmente de uma questão de opinião pessoal relativo ao grau de importância que se atribui a cada factor.
Penso que concordará com este ponto de vista.

Anónimo disse...

Concordo em absoluto! Mas penso que seria muito importante e proveitoso chegarmos a uma conclusão que extrapole as nossas ou outras opiniões pessoais e que entre no campo de resultados concretos obtidos em estudos realizados sobre este assunto. Sou electrotécnico. Esse ambito não está nas minhas competências. Peço-lhe ajuda.

António Aguiar da Costa disse...

Certamente não será fácil chegar a uma conclusão absoluta. Agora o que é certo é que do lado da afirmação de que as barragens são um factor bastante relevante no impedimento do fluxo de sedimentos existe a posição do Professor Mota Oliveira, Professor Agregado do IST e especialista em Engenharia costeira, que representa uma posição que certamente terá conhecimento de causa.

Anónimo disse...

Uma conclusão absoluta é muito difícil de atingir e relembro, eu sou eng civil, do ramo da hidráulica +e certo, mas também não sou nenhum especialista na matéria. De qualquer forma falo com base nos conhecimentos gerais que tenho sobre a matéria e em algumas opiniões científicas, tais como a referida, do Professor Mota Oliveira do IST, bem como do Professor Veloso Gomes, Catedrático da FEUP, e com uma carreira académica dedicada a estas questões, sendo inclusive o actual responsável por um Grupo de Trabalho estabelecido pelo governo responsável pela análise e avaliação da Gestão litoral do nosso país. Como é óbvio, não existe uma conclusão do tipo 2+2 são igual a 4 nesta matéria, mas é bastante razoável pensar que se os rios são a principal fonte de alimentação de areias para a costa e que a retenção de sedimentos nas barragens é de tal forma significativa que tem dado azo a estudos e reavaliações por questões operativas das barragens (inclusive do ponto de vista da diminuição do volume armazenado e de qualidade da água disponível), tb é certo que devemos equacionar a hipótese de esta ser uma importante condicionante para a erosão de algumas zonas. Além disso, se se pretender avaliar um exemplo concreto do que tenho afirmado, relativamente à grande diminuição do fluxo de sedimentos trasnportado por via fluvial, temos o caso do Douro, cuja restinga (vulgo "língua" de areia situada no Cabedelo)tem diminuido de forma consíderável, e deslocado no sentido do rio (fruto da influência cada vez maior do mar, ou dever-se-á dizer da influência cada vez menor do rio...). È também por esta razão que se estão a construir os molhes do Douro, procurando minimizar esta influência para montante da ondulação e marés, inclusive para questões de navegação. Não é nenhuma conclusão exacta, mas penso que o exemplo poderá ser mais elucidativo.