segunda-feira, novembro 20, 2006

Engenharia Política II

Contribuição para o SmartEngineering de Carlos Oliveira Cruz, docente do Departamento de Engenharia Civil do Instituto Superior Técnico da UTL
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Esta pequena divagação não deve ser lida per si mas sim como continuação do artigo de 25 de Outubro de 2006, da autoria do António Aguiar da Costa, com o título Engenharia Política.

Com efeito, o autor termina o seu artigo da seguinte forma, e permitam-me que o cite:

Por outro lado, da mesma forma que o Nobel pretendeu salientar a importância da Economia Política, talvez faça falta pensar na Engenharia também segundo essa vertente. Tentar que ela penetre na sociedade e se mobilize política e socialmente. Olhar para a engenharia não só como uma indústria, mas como uma solução para diversos problemas da sociedade.

Efectivamente, e foram várias as conversas sobre este assunto tidas com o referido autor, a engenharia tende a assumir cada vez mais um papel transversal, abarcando diversas áreas desde as ciências exactas até às ciências sociais e políticas.

Dizia o Prof. Crespo de Carvalho, num artigo recentemente publicado, que tirou o curso de engenharia e nunca quis ser engenheiro.

Compreendo perfeitamente as palavras do Professor e rever-me-ia completamente nessas palavras, não fosse uma pequena nuance. Eu vejo-me como engenheiro, contudo não na concepção que infelizmente nos é incutida, e parece proliferar pela nossa sociedade impune às novas tendências mundiais, hermeticamente isolada dos desafios contemporâneos.

Os problemas são cada vez menos quantitativos, ou melhor, talvez o seu grau de quantificação não tenha diminuído, o que aumentou certamente foi a quantidade de variáveis não quantificáveis, ou pelo menos variáveis como um grande grau de incerteza associado. É redutor, imaginar a engenharia como um ramo das ciências exactas, onde se procuram soluções optimizadas para os diversos problemas quantitativas.

Exige-se dos engenheiros, não que procurem nos problemas actuais hipóteses para aplicarem o que aprenderam, mas a posição deve ser precisamente a inversa: olhar para os problemas, e procurar resolve-los com recurso ao que se aprendeu, se tal for possível dada o carácter limitativo da nossa aprendizagem, e por isso se necessário aprender de novo.

Talvez não tenha sido claro… O que isto significa na prática é que o ênfase deve ser colocado nos problemas, nos problemas reais, da sociedade contemporânea, e não na aprendizagem, ou em problemas herméticos criados nas brilhantes mentes dos engenheiros do betão.

Importa por isso elevar a engenharia e o ensino da engenharia, para outro patamar. Para um patamar que dote os brilhantes engenheiros do futuro com ferramentas e instrumentos que lhes permitam observar a complexa realidade de uma forma sistémica, na sua globalidade, e não centrarem a sua observação naquilo que pode ser quantificado, ou encaixado nos seus caixotes de conhecimento.

Na prática, significa que as nossas escolas de engenharia devem iniciar uma forte aposta nas áreas de sistemas, gestão, economia e ciências sociais, ainda que, com prejuízo para uma ou outra cadeira de materiais de construção.

Certo da existência de perspectivas diametralmente opostas, julgo importante continuar a discussão levantada pelo António Aguiar da Costa.

Carlos Oliveira Cruz

1 comentário:

Anónimo disse...

Carlos, gostei bastante de ler a tua participação aqui no blog. Penso que da forma que escreves, tens as tuas ideias bastante solidificadas e assimiladadas. No entanto permite-me que, em parte, discorde de um ou dois pontos focados na tua participação. Como engenheiro projectista, não vejo a engenharia “como um ramo das ciências exactas, onde se procuram soluções optimizadas para os diversos problemas quantitativas”. No entanto não posso deixar de concordar que a vertente meramente economicista prevaleceu, durante muito tempo, sobre as preocupações em matéria qualitativa. Desta forma, a engenharia, nos dias de hoje terá obrigatoriamente que ser vista sob o ponto de vista de uma ciência em constante desenvolvimento e mutação benigna, ao serviço das sociedades e isenta de complexos de inferioridade. Um abraço!